Quando declamou, com segurança e vivacidade, um dos seus poemas, The Hill We Climb (‘a colina que subimos’), na tomada de posse do Presidente americano Joe Biden, no passado dia 20 de janeiro, Amanda Gorman, de 22 anos, tornou-se a mais jovem poetisa a ter esta oportunidade e ganhou, simultaneamente, um destaque que promete continuar a crescer. Depois disso, assinou contrato com a agência de modelos IMG, discursou no Super Bowl, a final do campeonato de futebol americano (participação que estava agendada já antes da cerimónia de Biden), e foi capa da revista Time, entrevistada pela antiga primeira-dama Michelle Obama.
Segura, assertiva e feminina, a jovem Amanda tornou-se uma espécie de estrela do Renascimento Negro, movimento cultural e político de valorização da identidade afro-americana que tem vindo a ganhar expressão nos últimos anos. “Em todas as formas de expressão da vida humana estamos a ver a arte a beneficiar da experiência negra. Não consigo imaginar nada mais entusiasmante”, disse a Michelle Obama na referida entrevista.
Entre muitas outras qualidades, Amanda é um exemplo de perseverança: depois de uma infância afetada por várias infeções nos ouvidos, que resultaram num distúrbio auditivo e consequente dificuldade na fala (nomeadamente na pronúncia da letra erre), trabalha duplamente para declamar poesia em público sem acusar o esforço. Uma força de caráter que acredita ter herdado da mãe, Joan Wicks, professora de Inglês e mãe solteira que criou sozinha três filhos: Amanda e a irmã gémea, Gabrielle, hoje ativista e cineasta de profissão, e um rapaz, Spencer, o mais velho. Tema que aborda no poema que declamou no Capitólio (aqui numa tradução da poetisa portuguesa Raquel Lima, disponibilizada pela Casa Fernando Pessoa):“Nós, os herdeiros de um país e de um tempo onde uma miúda negra magricela descendente/de escravizados e criada por uma mãe solteira pode sonhar em tornar-se Presidente, e logo/ver-se a declamar para um.”
Nascida em Los Angeles, Califórnia, onde reside, Amanda é o exemplo de uma geração que se preocupa com o planeta, a igualdade de género, valoriza a educação, tem uma ambição saudável e assume que pretende candidatar-se à presidência dos EUA em 2036. A notoriedade não é de agora, só aumentou com a exposição. Licenciada em Sociologia pela Universidade de Harvard, já escreveu para o New York Times, foi convidada de programas televisivos, recebeu diversos prémios, nem todos de escrita, e é o membro mais jovem de uma organização americana que ajuda crianças e jovens a melhorar as suas capacidades de escrita. No seu caso, é uma paixão que vem da infância e os três livros que serão publicados este ano, um deles infantil, já lideram o top de vendas da Amazon. “A poesia é a lente que usamos para interrogar a história que vivemos e o futuro que defendemos. Não é uma coincidência que na base da Estátua da Liberdade esteja um poema. O nosso instinto é virarmo-nos para a poesia quando queremos comunicar a essência de algo maior do que nós próprios”, diz na entrevista à Time.