Dois meses e meio depois do acidente de viação que quase lhe tirou a vida, João Espírito Santo conta que foi a vontade de viver, o amor pela família e a fé que o salvaram. Ainda em recuperação, o médico dentista mantém o sorriso e a boa disposição que sempre o caracterizaram.
Tudo aconteceu no dia 26 de outubro, no final da auto-estrada que liga Braga ao Porto. Ao despiste, sobre o qual tem pouca memória, seguiram-se 13 dias em coma. Regressou à vida no dia em que o filho João fez oito anos, 9 de novembro. Desde então está em recuperação e, graças à sua força de vontade, tudo volta a parecer possível. Empenhado em agradecer o afeto que tem recebido, retomou as rotinas e, embora ainda não esteja a trabalhar, passa o dia na sua clínica, a Medical Art Center, cujo funcionamento está plenamente assegurado pela sua equipa. Hoje, mais do que nunca, a família é a sua prioridade. A mulher, Mariana Seabra – a grande heroína neste triste acontecimento –, os filhos, Leonor, de dez anos, João, de oito, e Bernardo, de cinco, os pais, a irmã, os sogros e os cunhados estiveram sempre ao seu lado. Mas esta adversidade mostrou também ao médico dentista que tem bons amigos e colegas de trabalho. Habituado a dar, desta vez João Espírito Santo recebeu, e foram muitas as provas de amizade e consideração: “Não sei gerir tanto afeto. Tudo o que dei pelo próximo recebi agora, e de forma muito especial.” Sempre positivo e otimista, recebeu-nos no seu local de trabalho, onde espera voltar a exercer a sua paixão muito em breve. “Tenho muita força para viver!”, afirma.
– Que memórias tem do dia do acidente?
João Espírito Santo – Estava a regressar ao Porto, vinha de uma reunião com o meu grupo de trabalho do departamento de cirurgia oral da faculdade. Lembro-me de ligar à Mariana durante a viagem a dizer que ia passar na clínica antes de irmos à missa de sétimo dia que tínhamos ao final da tarde. Atrás de mim vinha um carro a grande velocidade, mas eu não tinha como desviar-me, estava a dar margem de segurança para o carro da frente. Não sei dizer se o carro me bateu por trás, mas lembro-me de ter subido o separador central e capotado. No momento seguinte ouvi vozes a dizerem que eu estava morto, mas eu não conseguia responder. Quando me estavam a desencarcerar, a minha maior preocupação era que não me cortassem as pernas e lembro-me de mexer os pés para lhes mostrar que não estava morto. A equipa do INEM no local fez um trabalho incrível, assim como a das urgências do São João, foram excecionais. Naquele momento acudiram à minha vida e à dos meus, porque se eu tivesse partido iria ser muito penoso para os que cá ficassem.
– Quem deu a notícia à sua mulher?
– O João Gião, com quem tinha estado na reunião de trabalho. Ele vinha mais atrás e ligou à Mariana. Disse-lhe que eu tinha tido um acidente grave e que fosse para o São João. Lá, foi-lhe dito tudo de forma frontal: que eu era um excelente dador de órgãos, que o quadro era mau, reservado, e que era mais provável correr mal que bem. Depois tive tudo o que é possível ter de bom. Equipas excelentes a acompanharem o meu processo e muita fé. A Mariana sempre acreditou que eu iria voltar. Eu próprio senti isso quando saí de coma, talvez por isso esteja tão dinâmico e ativo. Para mim ficou tudo mais claro: quero viver mais os meus filhos e a minha família. As prioridades não mudaram, mas ganharam outra dimensão. Quero continuar a ser um pai presente, a ser um bom profissional e estar na vanguarda da formação da prática clínica. O acidente ajudou-me a perceber quem é realmente meu amigo e dos meus. Foi muito importante perceber o amor que tenho à minha volta e agora quero estar com quem me ama e me cuida. O grande ensinamento que tiro disto tudo é que quero viver mais para os meus.