Cecília Guimarães: "Dediquei toda a minha vida ao teatro"
Este agosto, a atriz celebra 60 anos de carreira. Com uma memória invejável, Cecília Guimarães partilhou com a CARAS a sua história.
É com um orgulho indisfarçável que Cecília Guimarães descreve os seus 59 anos de carreira, que começou em 1953, com a sua estreia na peça As Duas Causas, na companhia Alves da Cunha. A partir daí, a atriz pisou os mais variados palcos nacionais, destacando-se o Teatro Nacional D. Maria II, o Teatro Nacional de São Carlos, o Teatro de Almada, o Teatro Experimental de Cascais e o Teatro da Trindade. Do extenso currículo, com o qual poucos atores portugueses conseguem concorrer, fazem ainda parte o teatro radiofónico e televisivo, algumas telenovelas e séries de televisão, como o Hotel 5 Estrelas, que estreou recentemente na RTP.
Recordando o ano de 1972, Cecília Guimarães voltou ao Teatro Nacional de São Carlos, onde participou na ópera Guerras do Alecrim e Manjerona e conversou com a CARAS sobre as aventuras que viveu em cima de tantos palcos.
– Há 60 anos não terá sido fácil seguir uma carreira na representação...
Cecília Guimarães – Nunca foi fácil e a palavra ‘ator’ acarreta muita responsabilidade. Atualmente é que fazem um casting para manequins e no dia seguinte para atores! Não pode ser. A pessoa tem de ter boa dicção, uma certa figura e ser um bocadinho culta.
– Fica aborrecida com esse facilitismo?
– Não pode ser, porque não sabem falar. Eu tive como mestre uma grande atriz chamada Maria Matos e ela dizia: “Meus filhos, nunca se esqueçam de que um ator quando entra em cena tudo mexe, dos miolos às tripas. Temos de estar no palco com alma.” E isso hoje não se vê.
– Como percebeu que queria ser atriz?
– Os meus pais levaram-me com cinco anos ao teatro. Quando cheguei a casa queria imitar as pessoas que via no palco. Contudo, segui os meus estudos para ser enfermeira ou médica, pois nessa altura ainda não via a representação como carreira. Mas não consegui passar a matemática, obrigatória para esses cursos, e comecei a pensar na hipótese de seguir teatro. A minha mãe não queria, mas tive o apoio do meu pai, que sempre disse que tinha de seguir aquilo que queria e matriculou-me no Conservatório de Teatro. Só me disse que se chumbasse no primeiro ano ia para a costura!
– E como era a vida de um ator na década de 50?
– Era boa. Nunca senti que fosse olhada de lado. Havia muito respeito pelas companhias de teatro, muito companheirismo entre colegas e as pessoas eram muito bem educadas, não havia cá essa coisa de ‘tu cá, tu lá’.
– Conseguiu conciliar a dedicação ao teatro com a sua vida familiar?
– Nunca tive filhos na vida real, mas no teatro tive mais de 60! Dediquei toda a minha vida ao teatro. Foi uma opção minha. Na década de 50 fui representar a Angola e aí apareceu-me um namorado. Comecei a pensar que me tinha estreado há um ano, que depois ficava cheia de filhos e não podia continuar a minha profissão e acabei o namoro. O teatro é magia, descoberta e quando o pano levanta é uma emoção! Fiz o melhor que sabia. O teatro deu-me muitas alegrias e alguns desgostos. Por exemplo, fiz uma matiné no dia em que a minha mãe morreu, porque era isso que os atores mais velhos faziam.
– O Festival de Almada prestou-lhe homenagem no ano passado. Isso deixou-a nostálgica?
– Ainda bem que me prestaram a homenagem em vida, porque em Portugal só se lembram das pessoas depois de morrerem. Achei a homenagem justa, não me deixou nostálgica.
– Gravou recentemente a série Hotel 5 Estrelas. Gostou de voltar à televisão?
– Sim, gostei. Foi divertido, mas também muito cansativo, porque agora já não se valorizam muito os ensaios.
– Considera-se uma grande atriz?
– Toda a gente diz isso, portanto, não vou desmentir! Sinto que cumpri a minha missão.