Luísa Cruz, de 49 anos, assume que gosta de ser uma pessoa diferente, que se distingue pelo que faz. Não é por snobismo, mas pela necessidade categórica que sente de ser criativa e não fazer
"duas vezes a mesma coisa." Descreve-se como
workaholic, mais por necessidade do que por prazer, pois tem medo de vir a arrepender-se daquilo que não fez. Atriz, mulher e mãe de
Maria, de 15 anos, Luísa convive bem com as suas inseguranças. Aliás, a perfeição, para si, é uma procura
"sem graça nenhuma".
Durante uma tarde passada no Tivoli Palácio de Seteais, a atriz, galardoada pela segunda vez com o Globo de Ouro para Melhor Atriz de Teatro, deixou-nos entrar no seu mundo interior e revelou a mulher que deixa do lado de fora dos palcos.
– O sucesso e o reconhecimento, como a atribuição dos Globos de Ouro, são um peso, uma responsabilidade acrescida ou, de alguma maneira, são um alívio, uma segurança?
Luísa Cruz – Não sinto como peso, mas também não sinto como alívio. Trabalho exatamente da mesma maneira. O que os prémios me dão é reconhecimento e é muito bom sermos amados e queridos pelos outros. Sentimos que não é em vão que trabalhamos tanto, que deixamos a família… Não trabalho para o reconhecimento, mas ele vem porque trabalho desta maneira. O palco é o sítio onde o ator está mais escondido de si próprio, porque temos sempre a desculpa da personagem. Mas, ao mesmo tempo, esta profissão também exige um trabalho pessoal muito grande, uma espécie de meditação, um encontro connosco mesmos para depois poder partilhar, que é uma ótima oportunidade para sermos felizes.
– E que Luísa é que tem encontrado no meio desse trabalho mais interior que faz?
– O que posso dizer em relação a isso é que posso ser muito mais do que aquilo que sou, a todos os níveis. Sou exigente, tento ser criativa. Vivo bem com as rotinas, mas não gosto de fazer duas vezes a mesma coisa.
– É uma pessoa irreverente, que gosta de ser original?
– Eu quero inovar e para isso é preciso ousar-se e fazer diferente. Podemos criar muitas coisas, mas se não for diferente não é interessante. O que é interessante é aquilo de que temos mais medo, que é o desconhecido.
– Na sua vida pessoal também tem essa atitude de não fazer tudo como mandam as regras?
– Na minha vida pessoal sou mais conservadora. Não ouso tanto.
– E que tipo de mãe é?
– Comigo e com a minha filha vive a minha sobrinha, somos só mulheres. Assim, a Maria tem uma pessoa que em termos de idade está entre ela e eu. E é ótimo para fazer de ponte. Eu, como mãe, acho que sou muito democrática. Hoje em dia, as mulheres divorciadas, como é o meu caso, têm de ser mães, pais, polícias, excelentes profissionais, giras, sem celulite, sempre bem dispostas e maravilhosas. E se não formos isso todos os dias é mesmo um problema… A mim falta-me a autoridade, porque sou muito democrática. Às vezes é doloroso, porque tenho de fazer esse papel de polícia e de pai, que é uma chatice mas que tem de ser feito.
– Que relação que tem com o trabalho? É uma
workaholic?
– Às vezes tenho de ser, mas faço-o contrariada. Mas penso que se não fizer determinado trabalho agora, posso nunca mais o fazer. Arrependo-me mais daquilo que não faço do que daquilo que faço e, portanto, vou fazendo.
– E quando faz uma pausa sabe desfrutar dela ou fica sempre a pensar no que poderia estar a fazer?
– Não, eu sei parar e desfruto disso. Não tenho medo dos tempos mortos, porque vivo muito o meu lado pessoal. Adoro a minha vida familiar, sou um bicho de casa. Não me veem em festas. É muito difícil sair. E por vezes é difícil estar com muitas pessoas. É uma questão de insegurança da minha parte.
– É uma pessoa insegura?
– Felizmente, sou uma pessoa insegura! São as nossas inseguranças que nos fazem avançar. Senão, éramos perfeitos e não tinha graça nenhuma!
– É uma adepta da filosofia de vida oriental. Como é que surgiu esse interesse?
– Desde os 14 anos que tenho contacto com o macrobiótico, vegetarianismo, acupuntura, com medicinas alternativas… Isso fez-me pensar o estilo de vida que temos no ocidente e penso que temos muito a ganhar com as medicinas orientais e com os ensinamentos milenares que nos propõem. Quando tenho tempo, gosto de meditar e fiz um curso de
shiatsu e reflexologia… Digamos que tenho outra carteira profissional.
– Gostava de um dia poder dedicar-se totalmente a estas práticas orientais?
– Gostava. Não me fazia confusão nenhuma mudar completamente de vida.