A facilidade com que perde a timidez diante de uma câmara faz perceber por que Sandra Barata Belo foi escolhida para interpretar o papel de Amália Rodrigues na longa-metragem Amália – O Filme. Aos 30 anos, a actriz estreou-se no cinema no papel da diva do fado, tendo sido seleccionada depois de ter feito duas cenas e cantado em playback dois fados.Foi durante uma tarde passada no Miradouro de S. Pedro de Alcântara, em Lisboa, que a actriz falou sobre esta experiência, mas também sobre o facto de querer, já de início, demarcar uma fronteira clara entre a sua vida pessoal e profissional. Razão pela qual não quis adiantar pormenores sobre o namorado, o também actor Manuel Sá Pessoa. A actriz justifica que compreende a necessidade de promover o seu trabalho, mas considera que tem direito a manter fechadas as portas que dão acesso ao seu universo privado. – Demorou dez semanas a gravar o filme. Deve ter sido um processo bastante intenso…Sandra Barata Belo – É mesmo essa a palavra, intenso. Mas também foi muito apaixonante, enriquecedor e vai marcar-me para sempre. Apaixonei-me pela personagem, foi um prazer ter falado com as pessoas que falei, ter lido e relido informação sobre a Amália. Por mais vezes que ouvisse as suas músicas, o que era necessário para me preparar para os playbacks de fado, nunca me fartava. Foi um projecto que tomei com muita intensidade e foi muito fácil estar apaixonada pela Amália. "Fazer o filme foi um projecto que tomei com muita intensidade e foi muito fácil estar apaixonada pela Amália." – Sentiu o peso da responsabilidade?- Claro que sim. Apercebi-me logo da responsabilidade que este trabalho teria, por isso, o que fiz foi preparar-me o melhor possível, pesquisar e estudar muito, para que essa responsabilidade fosse mais ténue. – O que fez então para se preparar para a personagem?- Li a biografia de Vítor Pavão dos Santos, vi filmes onde a Amália participou em nova, vi as entrevistas – algumas nem sequer foram apresentadas ao público -, falei com a Estrela, que era uma espécie de secretária dela, e, depois, a Ana Torres, produtora executiva da Valentim de Carvalho, falou com cerca de 25 pessoas e passou-me esses relatórios. Eu gostava de ter falado com muito mais pessoas, mas o tempo era escasso. Além deste estudo, tinha aulas de dicção e de canto, e tinha ainda ensaios com os actores e realizadores. Foram dois meses de ensaio e pesquisa, e embora possa parecer muito tempo, na verdade foi pouco. "Não tenho nada contra a promoção e divulgação do meu trabalho, desde que ele tenha qualidade e isso seja fruto de um mérito. A exposição e a fama, por si só, não me interessam." – A Amália é um dos maiores ícones da cultura portuguesa. Ficou a gostar mais dela?- Sem dúvida. É uma referência para todos. Acho que até pode ser um exemplo para as pessoas que trabalham em palco. Era também uma pessoa de extremos, tão depressa estava descontraída, com um sentido de humor fabuloso, no seu lado mais social, como depois, na vertente privada, se podia mostrar mais triste e sombria. Era intrigante. Para mim, é bom quando as pessoas são assim, tão díspares, pois não cabem num rótulo, não são uma só coisa. E ela tinha isso tudo, um lado existencialista que questionava tudo e mais alguma coisa. – Qual foi a maior dificuldade que encontrou neste papel?- O facto de ter interpretado este papel desde a adolescência até aos 64 anos. A caracterização foi muito dura e a nível emocional também não foi fácil. Acho que consigo perceber o que é uma mulher até aos 40 e poucos anos, mas depois disso já é mais complicado. – Está preparada para a projecção que este filme já começou a trazer-lhe?- Não sei, não sei. [risos] – É que, embora não seja inexperiente na profissão, agora passou a ser uma cara conhecida do público…- Bom, isso tem mais que ver com a personagem que interpretei, pois era uma figura incontornável em Portugal. Acho que esse mediatismo, no meu caso, vai ser temporário, até porque eu nem sequer o pretendo. Não tenho nada contra a divulgação e a promoção do meu trabalho, desde que ele tenha qualidade e desde que isso seja fruto de um mérito. Agora, a exposição e a fama por si só não me interessam nada. Gosto de continuar a minha vida e ser discreta sem que reparem ou falem de mim. "Se não fui tão conhecida do público até aqui, foi porque fiz projectos mais pequenos, mas que me faziam feliz." – Sente que esteve no sítio certo à hora certa, ou também teve que ver com a forma como se preparou?- Um pouco das duas coisas. Fui chamada para o casting depois de terem visto uma fotografia minha da L’ Agence e terem achado que o meu rosto era parecido com o da Amália quando era nova. Pessoalmente, acho que o meu casting não correu muito bem, mas às vezes não é só isso, conta também a forma como nos apresentamos e comunicamos com aquelas pessoas. Sei que gostaram de algumas das cenas que fiz nesse dia porque arrisquei, e tudo isso pesa. – Sentia-se preparada para as críticas?- Sim. A fase da crítica vem fechar o ciclo. Não posso fazer nada sem esperar opinião do público, pois é para ele que trabalho. Aliás, estava ansiosa para perceber o que mais intrigava as pessoas no filme, não tanto se gostaram ou não. – De todos os papéis que já fez, nomeadamente na Família Galaró e Chiquititas, este foi o que mais gostou?- Gostei muito de fazer este papel, mas também houve outros, em teatro, de que gostei muito. Não tenho uma cor preferida e só sei que este foi muito bom. É nisso que acredito e me foco. "Prezo por fazer bons trabalhos em que possa criar, mas nunca penso no sucesso que isso me possa trazer." – A Sandra ambiciona sucesso para o seu futuro profissional?- Prezo por fazer bons trabalhos em que possa criar, mas nunca penso no sucesso que isso me possa trazer. Aquilo que penso logo é na qualidade do trabalho e no facto de ser reconhecida por ter participado num bom projecto. Há pessoas que dão mais importância ao facto de serem bem remuneradas, há outras que dão preferência à qualidade, pois querem sentir-se bem no dia-a-dia. Eu sou mais assim, prezo a qualidade, e se não fui tão conhecida do público até aqui, foi porque fiz projectos mais pequenos, mas que me faziam feliz. Obviamente que se conseguir juntar um trabalho bem remunerado com bastante qualidade e que me dê projecção, melhor ainda. – Nesses dois meses de gravações intensas, deve ter sido muito complicado gerir a sua vida pessoal…- Foi difícil, sim, pois tinha poucas folgas e não havia muito tempo para estar com a família. – Não gosta de falar sobre a sua vida pessoal e nem sequer fala do seu namorado…- Porque é uma parte da minha vida, que é só minha. Prezo muito essa privacidade. – É, portanto, uma forma de se proteger…- Sim. De qualquer forma, nunca me interessou falar sobre isso. Falo sobre a minha vida com a minha família e os meus amigos. Acho que o público não tem nada que ver com a minha vida pessoal. Ao público tenho de mostrar trabalho.
Sandra Barata Belo: “Gosto das pessoas que não cabem num rótulo, como era o caso da Amália”
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